Empresas: Impactos das alterações climáticas no capital humano


Na comunidade científica falamos diariamente de números, de como as variações nas fronteiras planetárias se fazem sentir face à pressão humana e como seis dessas nove fronteiras já foram ultrapassadas.

No domínio político, a polarização de posições teima em persistir, levando a uma miríade de atuações e posicionamentos divergentes e, alguns deles, ao retrocesso de objetivos e metas, outrora comuns. No foro social, atualmente, quase três quartos da população adulta mundial (72%) afirma que as alterações climáticas são uma ameaça “algo” ou “muito” grave para a sociedade nos próximos 20 anos.

Mas será que o capital humano é afetado pelas alterações climáticas? Vejamos.

Ameaças das alterações climáticas à saúde e ao bem-estar

Embora tenham ocorrido avanços significativos na avaliação dos impactos económicos do clima nas organizações, houve um menor progresso na análise dos efeitos sobre o capital humano.

Segundo os últimos dados publicados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), as alterações climáticas estão a inverter o desenvolvimento humano, contribuindo diretamente para as emergências humanitárias decorrentes de vagas de calor, incêndios florestais, inundações, tempestades tropicais e furacões, que aumentam em escala, frequência e intensidade.

Estima-se que ocorreu um aumento de 68% nas mortes nas últimas duas décadas relacionadas com o aumento das vagas de calor em todo o mundo e, se as emissões de gases com efeito de estufa continuarem sem controlo, em 2100 o número de mortes causadas pelo calor extremo ultrapassará a atual taxa de mortalidade global de todas as doenças infeciosas combinadas. Já para não mencionar que os fatores de stress climático aumentam os riscos de doenças transmitidas pela água e pelos alimentos.

Na verdade, num estudo publicado pelo World Bank Group (instituição financeira internacional que efetua empréstimos a países em desenvolvimento) é inequívoco o facto de que as alterações climáticas são uma ameaça direta ao capital humano, pois condicionam a aprendizagem, prejudicam os meios de subsistência, intensificam as doenças, promovem a subnutrição e a dificuldade no acesso a bens e serviços de primeira necessidade.

Ainda que não sejam sentidas com tanta veemência no norte global, são cada vez mais evidentes pela sua frequência e intensidade: inundações, deslizamentos de terras, furacões e tornados interrompem a escolaridade e os serviços de saúde, limitam a capacidade das pessoas de obterem rendimentos e deslocam milhões de pessoas todos os anos.

Portanto, podemos inferir que os impactes sentidos são transversais, variando desde a segurança alimentar, nutrição, riscos de saúde, acesso à educação, perdas financeiras relacionadas com a perda de ativos, aumento da morbilidade e mortalidade, entre outros.

Estratégias para promover o capital humano em tempos de crise climática

Estamos perante um cenário dantesco, mas podemos identificar algo comum e que representa um elevado potencial em todas as organizações, as pessoas (ou capital humano).

Acredito firmemente que colocar as pessoas no centro da estratégia empresarial é essencial para alcançar um crescimento sustentável. Quando valorizamos e investimos no nosso capital humano, criamos um ambiente de trabalho que promove inovação, produtividade e resiliência.

Por outro lado, o aumento do investimento e aposta em capital humano também pode apoiar a inovação de produtos e serviços focados num menor teor de carbono que reduzam as emissões de gases com efeito de estufa. Estes serviços podem incluir, a título de um ínfimo exemplo: a melhoria da conceção de edifícios, a expansão da construção de instalações de saúde e de ensino, o aumento da utilização de energias renováveis e de intervenções no domínio da eficiência energética, a intensificação da redução e da gestão dos resíduos, a melhoria e inovação em processos industriais, a melhoria das políticas de transportes ou mesmo de consumo de água. As hipóteses são inúmeras!

A par, importa referir que a consciencialização e capacitação no domínio das alterações climáticas e do desenvolvimento sustentável, promove uma consciencialização coletiva, sendo um elemento essencial na resposta local e global ao combate às alterações climáticas, em prol de um desenvolvimento (mais) sustentável, apoiando a necessária e desejável adaptação e mitigação das organizações, mas também em última instância, das suas pessoas.

Desengane-se quem pensa que os esforços mundiais endereçados por inúmeras entidades e organizações, no domínio da sustentabilidade e do desempenho ESG, é sobre a proteção do planeta.

Lurdes Guerra, Senior Sustainability Consultant

Fontes:

– The evolution of the planetary boundaries framework. Richardson et al. 2023, Steffen et al. 2015, and Rockström et al. 2009.
– World Risk Poll 2024 Report – What the world worries about: global perceptions and experiences of risk and harm.
– Romanello et al. (2022).
– Carleton et al. (2022).
– World Bank Group, How to protect, build and use human capital do address climate change. 2023.


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